Isabelly Moraes e o poder feminino no jornalismo esportivo

16/11/2021
Reprodução - EL País
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"É um desafio enorme ter que provar todos os dias que sou mulher, gosto de futebol, me dedico para o futebol e que isso é minha vida, assim como a de muitos homens"

As mulheres têm conquistado cada vez mais espaço entre os times de comentaristas e narradores no mundo dos esportes. Em 2018, o Brasil conheceu Isabelly Morais, que foi revelada no canal Fox Sports durante a Copa do Mundo e hoje é narradora e comentarista no grupo Band. Com apenas 23 anos, a jornalista mineira já possui uma carreira com grandes histórias e momentos inesquecíveis. Conheça Isabelly Morais, a primeira mulher a narrar uma partida de futebol no rádio mineiro e a primeira da história a abrir uma transmissão de Copa do Mundo comandando os microfones na televisão.

Como você chegou ao jornalismo esportivo? Você sempre quis essa área desde a faculdade? Conte um pouco sobre a sua trajetória.

Eu entrei na comunicação por causa do esporte, sempre gostei de acompanhar e praticar, então desde o meu primeiro dia na faculdade eu já falava que o meu sonho era trabalhar com jornalismo esportivo.

Naquelas primeiras apresentações que acontecem nas aulas, eu já falava meu nome, de onde eu era e o meu sonho de atuar no esporte. Por conta desse sonho, eu sempre busquei trabalhar em áreas que estivessem relacionadas ao esporte. Comecei em uma assessoria dentro da faculdade que atendia um centro de treinamento e de uma escola de Educação Física e, com essa experiência, eu comecei a aprender a lidar com pautas do esporte. Com o decorrer da faculdade, eu comecei a escrever para um site colaborativo de jornalismo esportivo bem clássico, onde eu tinha pautas sobre os clubes e pautas diárias dos jogos. Foi nesse momento que surgiu a minha primeira oportunidade de narrar, quando me tornei estagiária na Rádio Inconfidência, que é uma emissora de rádio pública do estado de Minas Gerais. Esse estágio me abriu muitas portas, inclusive para a grande oportunidade que tive de narrar a Copa do Mundo de 2018 pela Fox Sports.

Você hoje atua como narradora na Band. Como foi o processo de chegar até o seu atual cargo?

Eu estreei como narradora na Band em novembro de 2020. Antes de eu entrar na Band, já tive a oportunidade de narrar alguns jogos, a minha primeira vez sendo em 2017 e desde então eu não parei mais. Apesar de eu não saber como o meu contato chegou até eles, a Band me chamou já conhecendo o meu trabalho, inclusive com o futebol feminino, modalidade em que trabalho há mais de cinco anos. Ouvi a proposta, fiz um piloto, passei por todo processo seletivo deles para o cargo e, quando fui convocada para o time da Band, eu me mudei de Minas para São Paulo no outubro de 2020, onde estou até então.

Como funciona a rotina de uma narradora?

Antes de explicar a rotina de uma narradora, gosto de contar a minha rotina na Band. Eu hoje atuo em várias frentes da emissora. Na Band eu sou narradora, já na Rádio Bandeirantes eu atuo como repórter e as vezes estou como comentarista em alguns programas. Também participo de programas e narro alguns jogos no BandSports, que é o canal específico do assunto do grupo Band. Tenho uma fluidez muito grande no esporte da Band no geral e isso é muito bom para mim e para a minha carreira, aprendo bastante com essa oportunidade de estar sempre presente representando o esporte. Agora, falando da rotina de uma narradora no geral, é algo resumido em bastante estudo. É necessário que a gente assista a todos os jogos e rever se for preciso. Precisamos entender como as equipes jogam, como são os atletas, suas histórias, suas trajetórias em outros clubes. Eu sou uma pessoa que não gosta de falhar e isso faz com que eu esteja sempre muito bem preparada para as narrações.

Quais são os maiores desafios de quem trabalha com o jornalismo esportivo?

Existe um desafio que eu particularmente adoro, que é estar ligada em tudo que for possível no mundo do esporte. Eu tento assistir o máximo de competições que estejam tendo, independente do esporte e da categoria que seja, também tento acompanhar vários atletas, sejam eles nacionais e internacionais. Também é preciso de atenção redobrada nos esportes no geral, como eu falei quando expliquei a minha rotina. Por mais que seja o sonho de muitos, o jornalismo esportivo não é só o futebol masculino, e é preciso lembrar disso sempre que falamos sobre acompanhar outros esportes e modalidades. São diversos desafios que envolvem um profissional da área do esporte, mas de longe o mais difícil é lidar com as torcidas. É comum que surjam comentários mal-educados ou muito desrespeitosos, principalmente nas redes sociais, que hoje é tratado como terra de ninguém. 

Agora falando como mulher, creio que o maior desafio é ser mulher no mundo dos esportes, principalmente no futebol masculino. Na minha opinião existem inúmeros narradores e comentaristas homens que tem muito pouco conteúdo para oferecer, mas basta uma mulher comentarista com uma bagagem de conhecimento enorme fazer um comentário que o nome dela certamente vai parar nos assuntos mais comentados do Twitter em questão de segundos. As mulheres precisam estar sempre firmando a credibilidade do seu trabalho para que possa ser tão respeitada como um homem. Eu sei que existem pessoas que quando colocam na Band e escutam a minha voz, já mudam de canal, colocam no mudo, ficam mesmo de má vontade por ser uma mulher narrando, sem me dar nenhum espaço para mostrar o meu trabalho. 

Na Band nós possuímos uma hashtag para os telespectadores interagirem com a gente e teve jogo que não divulgava mais porque eu acabava lendo durante a partida comentários que me magoavam bastante, alguns até conseguiam me desestabilizar. É um desafio enorme ter que provar todos os dias que sou mulher e gosto de futebol, me dedico para o futebol e que isso é minha vida, assim como a de muitos homens.

Você faz parte de um grupo de mulheres que estão mudando o cenário do jornalismo esportivo no Brasil, já que quase não tínhamos mulheres narrando. Como é para você fazer parte desse time de representatividade?

É muito lindo ver e fazer parte desse movimento de mulheres narradoras no Brasil. Eu tenho recebido muitos pedidos de indicações de narradoras, e isso prova que a galera está empenhada em ampliar cada vez mais esse espaço de mulheres narrando. Quando eu narrei pela primeira vez em 2017, não se tinha outras mulheres que narravam, eu não tinha alguém para olhar e me inspirar, e isso nem faz tanto tempo assim. 

Hoje eu me inspiro nas minhas colegas que estão no ar assim como eu e isso é bom porque podemos juntas mostrar que nós podemos sim narrar partidas de futebol e ao mesmo tempo inspirar outras mulheres a começarem a narrar também. Uma mulher que liga a televisão e ver uma de nós narrando, ela se sente encorajada em fazer também e isso é lindo. 

Acho que no futuro nós teremos uma noção maior do que é esse momento de inspiração e representatividade que estamos vivendo, e eu espero que não seja um momento passageiro. Tenho muito orgulho de mim e das minhas parceiras de trajetória pelo que estamos construindo.

O jornalismo esportivo é uma das áreas mais visadas pelos alunos que entram no curso. Qual dica que você dá para quem está chegando e quer trabalhar nesse ramo?

A principal dica que eu sempre do é se envolver no máximo de projetos que a pessoa consiga. Por exemplo, no meu primeiro trabalho, que foi dentro da faculdade, eu estava como voluntária, eu não recebia nada para prestar aquele serviço. Financeiramente não foi fácil, precisei me virar um pouco até ganhar uma bolsa, mas valeu a pena pela quantidade de coisas que aprendi. Aproveitar as oportunidades dos projetos sempre! É a partir deles que nós absorvemos conhecimentos, aprendemos a prática, conhecemos pessoas, o que são pontos fundamentais para construir uma carreira. 

Desde a minha prática até os dias de hoje eu aprendi, e sigo aprendendo, muito e eu valorizo bastante isso. Outra dica que eu do é assistir sempre o máximo de esportes que você puder assistir, acompanhar, ler portais, jornais, não ficar preso ao futebol masculino brasileiro, o internacional também é importante. Esteja sempre bem antenado ao mundo dos esportes no geral, isso vai ser um baita diferencial lá na frente, conhecimento nunca é demais!

Para finalizar, gostaria de saber um momento marcante durante a sua trajetória até aqui.

Essa foi difícil porque eu tenho muitos momentos marcantes na minha carreira, mas se for para escolher um foi em 2017, quando eu ainda era estagiária da Rádio Inconfidência. Como eu já contei, foi lá que eu tive a oportunidade de narrar pela primeira vez. 

Essa minha estreia como narradora aconteceu no dia sete de novembro de 2017 e eu lembro que na semana anterior a esse momento eu tinha ido almoçar com o até então meu chefe, o jornalista José Augusto Toscano, pessoa que eu tenho um carinho enorme e sou muito grata por tudo. Ele já tinha me avisado que eu iria estreitar narrando um jogo da série B do Campeonato Brasileiro, era América-MG contra o ABC, e foi nesse almoço que eu contei que estava bastante preocupada, até porque eu nunca tinha narrado um jogo, ainda mais no rádio, que tem a suas particularidades, e eu lembro que ele me falou assim: "Isabelly, vai, erra e faz" e é isso que eu faço na minha vida desde então. 

Eu vou, eu erro, mas eu faço, jamais deixo de fazer. Raramente eu digo não, eu posso virar a noite estudando, aprendendo, vendo como funcionar, mas não digo não ou deixo de tentar.

Por Eduarda Marques de Menezes
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